Cultura

Há 125 anos nascia o surrealista André Breton

Líder do surrealismo e autor do ‘Manifesto Por uma Arte revolucionária e independente’, o escritor e poeta construiu legado determinante para a cultura em todo o mundo

08 de Março de 2021, 11:19

Eduardo Afonso Vasconcelos

O escritor, poeta e psiquiatra francês André Breton completaria 125 anos em 2021. Entre suas principais contribuições para a cultura mundial estão a liderança do último movimento de vanguarda europeia, o surrealismo, responsável por inspirar inúmeros segmentos artísticos, e a elaboração do “Manifesto por uma Arte revolucionária e independente”. Sempre com apelo à liberdade de criação, à formação do livre pensar e à ruptura com as convenções burguesas, os ideais surrealistas permearam diversos momentos do modernismo brasileiro e seguem se fazendo atuais pelo mundo afora. 

André Breton nasceu em 1896 no oeste da França, mas, ainda na adolescência, passou a viver em Paris, tomando gosto pelos simbolistas Charles Baudelaire, Stéphane Mallarmé e Arthur Rimbaud. Com 17 anos, às vésperas da Primeira Guerra Mundial, começou a cursar Medicina e, em 1915, foi convocado a trabalhar no serviço médico de Nantes, onde conheceu uma de suas maiores referências: o escritor e desenhista francês Jacques Vaché, ferido na linha de frente da guerra. Vaché acabou sendo responsável por abalar o apreço de Breton pelos poetas simbolistas, que o desenhista considerava ultrapassados. A influência de Vaché, somada à obra de nomes como o francês Alfred Jarry e o uruguaio-francês Conde de Lautréamont, incitou o líder surrealista à revolta diante do cenário político em vigência e à busca por uma poesia moderna. 

Uruguaio/francês Conde de Lautréamont: precursor do surrealismo

No ano seguinte, Breton foi transferido para o centro neuropsiquiátrico de Saint-Dizier e descobriu a obra de Sigmund Freud, outro importante norte para seu trabalho na poesia e literatura. Assim, atentou para algo fundamental ao surrealismo que ainda viria a formalizar: os mecanismos de funcionamento do inconsciente humano, a partir de análises do surgimento de delírios, interpretações de sonhos e experiências de sono induzido. 

Entre 1918 e 1919, após a leitura do “Manifesto dadá”, escrito pelo poeta judeu Tristan Tzara, envolveu-se com o dadaísmo. Em poucos meses, acompanhado dos escritores Philippe Soupault e Louis Aragon, lançou a primeira edição da revista Littérature, que passou a ser meio de divulgação importante do movimento dadaísta em 1920, com a chegada de Tzara a Paris.

Sigmund Freud, pai da psicanálise e influência decisiva para o movimento surrealista

No mesmo período, Breton descobriu o automatismo (ou escrita automática), procedimento que consiste na supressão do controle da consciência sobre o processo de criação artística, dando lugar ao inconsciente e à atividade autônoma do corpo. Com Soupault, publicou “Os Campos magnéticos” (1920), em que iniciaram o experimento de escrever sem premeditação, “com um louvável desprezo por quaisquer resultados literários”, tendo atingido um impressionante e diversificado repertório de imagens em seus textos. 

Um ano depois, nosso herói, assim como seus companheiros, abandonou o dadaísmo em razão de discordâncias políticas causadas pelo caráter nacionalista que começou a cercar o movimento. Como consequência, o periódico Littérature deixou de ser publicado, voltando a circular no início de 1922 com a formação de um novo grupo (Benjamin Péret, Paul Éluard, René Crevel, Robert Desnos, Roger Vitrac, Pablo Picasso, Marcel Duchamp, Max Ernst e Francis Picabia juntaram-se ao trio fundador, Breton, Philippe Soupault e Louis Aragon). Tais acontecimentos acabaram por estabelecer as bases definitivas do surrealismo. 

Capas das edições 5 e 7 da segunda fase da revista Littérature 

Em 1924, Littérature deixou de ser publicada definitivamente e o grupo que compunha a revista, em poucos meses, fundou o Escritório de Pesquisas Surrealistas. Quase imediatamente, André Breton publicou o “Manifesto do Surrealismo”, expondo de maneira definitiva os objetivos, valores e meios de atuação do movimento. O próximo passo, então, foi dar início à publicação de outra revista, A Revolução Surrealista. 

‘A Canção do Amor’ (1914), do italiano Giorgio de Chirico

A NÃO PERDER DE VISTA — Paul Éluard 

Dissipa o dia, 

Mostra aos homens as leves imagens da aparência, 

Retira aos homens a possibilidade de se distraírem. 

É duro como a pedra,

A pedra informe, 

A pedra do movimento e da vista, 

E o seu brilho é tal que todas as armaduras, todas as máscaras, 

se tornam falsas. 

O que a mão tomou desdenha tomar a forma da mão, 

O que foi compreendido já não existe, 

A ave confundiu-se com o vento,/ O céu com a sua verdade,/ O homem com a sua realidade. 

‘Os Amantes’ (1928): obra de um dos principais artistas surrealistas, o belga René Magritte
‘Na Primeira Palavra Clara’ (1923), do alemão Max Ernst
'Um Cão andaluz', surrealismo no cinema'
'Limite', filme brasileiro surrealista

SOMBRA DE PALHA — André Breton 

Dêem-me todas as jóias das afogadas 

dois presépios 

um cavalinho e uma agulha de chapeleira 

em seguida desculpem-me 

já que não tenho tempo de respirar 

sou um acaso 

a construção solar deteve-me aqui mesmo 

e agora nada faço senão deixá-la morrer 

procurem na tabela das contas atrasadas 

a trote na mão fechada debaixo da minha cabeça tilintante 

um copo no qual se abre um olho amarelo 

abre também o sentimento 

e no ar puro esvoaçam as princesas 

tenho nisso muito orgulho 

e ao mesmo tempo uma gotas de água insulsa 

para refrescar o vaso das flores bolorentas 

ao fundo da escada 

o pensamento divino no azulejo estrelado do céu 

a expressão das banhistas é a morte do lobo 

tende-me por amiga 

a amiga dos ardores e das raivas

que duas vezes vos olha 

alisai a vossa plumagem diz ela 

os meus remos de pau-santo fazem cantar vossos 

cabelos/ um som claro abandonava a praia/ negra da cólera dos seixos/ vermelha do lado do horizonte como uma chapa/ incandescente. 

‘Morte’ (1932), do pintor, desenhista, arquiteto, filósofo e poeta paraense Ismael Nery
 ‘Cidade (A Rua)’ , da paulista Tarsila do Amaral 

 

AU MOCASSIM O VERBO — Robert Desnos 

Me suicidas, tão docilmente. 

Te morrerei, contudo, um dia. 

Eu conheceremos a mulher ideal 

e, lentamente, nevarei em sua boca. 

E choverei, sem dúvida, mesmo que tarde, 

mesmo que eu faça bom tempo. 

Nós ameis tão pouco os olhos 

e verterei uma lágrima sem 

razão, é claro, e sem tristeza. 

Sem. 

‘Mulher de Braços Cruzados’ (1931), foto do artista visual e cineasta estadunidense Man Ray

Ficou claro o teor revolucionário do movimento pelo caráter anti racionalista de suas ideias, o que o colocava em oposição às tendências construtivistas e formalistas do pós-guerra. O surrealismo propunha retirar a sentença culturalmente criada contra os sentidos e os instintos humanos, tentando abolir convenções burguesas que acarretavam repressão e censura dentro e fora do campo das artes. Para os surrealistas, isso resultaria numa sociedade mais capaz de alcançar a verdade, já que o desprendimento da razão dominante convoca a outra forma de ler a realidade concreta. Tal princípio certamente explica boa parte dos temas surrealistas estarem atrelados ao espaço urbano, pois pretendem sempre abordar a subjetividade em termos materialistas. 

Enquanto isso, o Brasil sentia os efeitos da Semana de Arte Moderna desde 1922, ano em que Mário de Andrade publicou "Paulicéia Desvairada”, cujo “prefácio Interessantíssimo” apontava pela primeira vez para os rumos da literatura modernista. “Quando sinto a impulsão lírica, escrevo sem pensar tudo que meu inconsciente me grita”, defendia Mário, leitor de Freud, revelando intimidade com princípios surrealistas tais como a liberdade máxima de criação, a atuação do inconsciente e a negação das convenções culturais burguesas (ideias reforçadas posteriormente no modernismo). 

‘O Sono’ (1937), do pintor espanhol Salvador Dali

Tarsila do Amaral, quatro anos mais tarde, começou a se dedicar à pintura surrealista com a obra “Abaporu”, que acabou inspirando Oswald de Andrade a dar novo fôlego teórico ao modernismo brasileiro a partir do “Manifesto antropófago” logo na sequência. Nele, há a intenção crítica de assimilação cultural que absorve o primitivismo psicológico proposto pelos surrealistas na Europa, colocando em favor disso as tradições populares brasileiras. Em pouco tempo, dois romances brasileiros revelavam alguns aspectos surrealistas: “Macunaíma” (1928), de Mário, e “Serafim Ponte Grande” (1933), escrito por Oswald.

Esq. à dir., Bandeira é o segundo e Mário de Andrade o terceiro; Oswald em primeiro plano

Sob esse aspecto, o Brasil se apresentava como terreno fértil para as ideias surrealistas, uma vez que aqui já sobreviviam culturas indígenas e africanas em contraposição à cultura erudita – se as primeiras representavam uma força criadora, essa última se materializava na burguesia, caricatura das sociedades colonizadoras. 

No início de 1929, Benjamin Péret passou a morar no Rio de Janeiro e foi acolhido pelo grupo da Revista de Antropofagia, contribuindo para a solidificação de influências surrealistas no país. Logo escreveu o livro “O Almirante negro” (referência ao líder da Revolta da Chibata, João Cândido), que foi destruído pela polícia por seu caráter contestador. O mesmo fim tiveram as obras “Ponto de Partida”, de Mário Pedrosa, e “O Príncipe do Fogo”, de Febrônio Índio do Brasil, que guardavam valores surrealistas. Péret foi expulso do país no fim de 1931 por conta de sua atuação como militante trotskista filiado à Liga Comunista. 

Obra de 1928 do pernambucano Cícero Dias

A essa altura, os pintores Ismael Nery e Cícero Dias, o poeta Murilo Mendes e o escritor Ascânio Lopes já se interessavam pelo surrealismo. Mais tarde, juntaram-se a eles os escritores Jorge de Lima, Breno Accioly Rosário Fusco e Maura Lopes Cançado, a escultora Maria Martins, o fotógrafo Fernando Lemos, os pintores Wagner de Castro e Walter Lewy, o desenhista Albino Braz e a escritora e jornalista Patrícia Galvão (Pagu). Também era possível identificar traços surrealistas no cinema brasileiro, como no longa-metragem “Limite” (1931), de Mário Peixoto.

À época, dois nomes alagoanos despontaram: Jorge de Lima, nascido em União dos Palmares, e Breno Accioly, de Santana do Ipanema. O primeiro já apresentava aspectos surrealistas desde 1929, em seu livro “Poemas novos”, mas resumidas ao caráter onírico da obra. Foi em 1943 que Jorge de Lima representou mais fortemente o surrealismo por ocasião do lançamento de “A Pintura em Pânico”, em que expôs uma série de fotomontagens muito semelhante à prática de colagens surrealistas. No ano seguinte, Breno Accioly publicou “João Urso”, livro de contos que, imergindo na complexidade da mente humana, revela temas sobre a obscuridade do homem – inclusive, estabelecendo diálogo com os dramas psicológicos do próprio autor. Mário de Andrade chegou a declarar que “Breno Accioly de um nada faz um conto e acende numa vela a chama da angústia”. 

Fotomontagem feita por Jorge de Lima (1943) 
'O Doador’, obra do paulista Wagner de Castro
Breton e Trótski assinaram manifesto sobre arte e cultura

CANÇÃO DO EXÍLIO — Murilo Mendes, 1930 

Minha terra tem macieiras da Califórnia 

onde cantam gaturamos de Veneza. 

Os poetas da minha terra 

são pretos que vivem em torres de ametista, 

os sargentos do exército são monistas, cubistas, 

os filósofos são polacos vendendo a prestações. 

A gente não pode dormir 

com os oradores e os pernilongos. 

Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda. 

Eu morro sufocado 

em terra estrangeira. 

Nossas flores são mais bonitas 

nossas frutas mais gostosas 

mas custam cem mil réis a dúzia. 

Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade 

e ouvir um sabiá com certidão de idade! 

 

O alagoano Breno Accioly estreou com ‘João Urso’, 1944

NATUREZA MORTA — Pagu, 1948 

Os livros são dorsos de estantes distantes quebradas. 

Estou dependurada na parede feita um quadro. 

Ninguém me segurou pelos cabelos. 

Puseram um prego em meu coração para que eu não me mova 

Espetaram, hein? a ave na parede 

Mas conservaram os meus olhos 

É verdade que eles estão parados 

Como os meus dedos, na mesma frase. 

Espicharam-se em coágulos azuis. 

Que monótono o mar! 

Os meus pés não dão mais um passo. 

O meu sangue chorando 

As crianças gritando, 

Os homens morrendo 

O tempo andando 

As luzes fulgindo, 

As casas subindo, 

O dinheiro circulando, 

O dinheiro caindo. 

Os namorados passando, passeando, 

O lixo aumentando, 

Que monótono o mar! 

Procurei acender de novo o cigarro. 

Por que o poeta não morre? 

Por que o coração engorda? 

Por que as crianças crescem? 

Por que este mar idiota não cobre o telhado das casas? 

Por que existem telhados e avenidas? 

Por que se escrevem cartas e existe o jornal? 

Que monótono o mar! 

Estou espichada na tela como um monte de frutas apodrecendo. 

Se eu ainda tivesse unhas 

Enterraria os meus dedos nesse espaço branco 

Vertem os meus olhos uma fumaça salgada 

Este mar, este mar não escorre por minhas faces. 

Estou com tanto frio, e não tenho ninguém…/ Nem a presença dos corvos 

Passados períodos de certa escassez nos estudos dessa natureza — até hoje minoritários — , Pagu publicou vários textos de importância sobre o surrealismo ao fim dos anos 1950. No início da década seguinte, Sérgio Lima, Cláudio Willer e Roberto Piva criaram um núcleo de debates acerca do surrealismo em São Paulo, com três reuniões semanais em um bar no bairro central do Bixiga. Entre 1964 e 1969, esse grupo representou o primeiro movimento organizado do surrealismo no país, chegando a publicar um manifesto na revista surrealista Phala, coordenada por Sérgio Lima, que escreveu o texto com o argentino Aldo Pellegrini. Outros poetas aderiram à estética proposta, a exemplo de Raul Fiker, Leila Ferraz, Antonio Fernando de Franceschi, Décio Bar, Maninha Cavalcante, José Alcides Pinto, Zuca Sardan, Péricles Prade e Juan Sanz Hernandez.

Em 1980, o cineasta Glauber Rocha resumiu o problema do movimento no país afirmando que “o surrealismo para os povos latino-americanos é o tropicalismo”. Ainda assim, em São Paulo, houve a Semana Surrealista de 1985, responsável por impulsionar a formação de um terceiro grupo com as participações de Heloísa Pessoa, Laila Aiach, Lya Paes de Barros, Zoca Barros, Ivanir de Oliveira, Josifa Aharony, Nicole Evelyne Reiss, Nelson de Paula, Juan Hernández, Floriano Martins e Hilton Seallwright. 

Glauber Rocha: 'O tropicalismo é o nosso surrealismo'

De outro lado, na França da década de 1920, o surrealismo ganhava cada vez mais complexidade, pois os conflitos políticos se acirravam, o que fez André Breton ingressar no Partido Comunista em 1927. Então, no “Segundo Manifesto surrealista” (1930) e em “O Surrealismo a Serviço da Revolução” (1933), baseado nas teorias de Karl Marx, ele se convence de que apenas será possível garantir a liberdade criativa através da emancipação dos povos, trazendo como uma de suas metas libertar os estudos da psicanálise da estrutura capitalista. Após muita insatisfação com a força do stalinismo na França, Breton, militante trotskista, é afastado do partido em 1933, o que acelerou sua aproximação de Leon Trótski, com quem criou a Federação Internacional da Arte Revolucionária e Independente.  

A proposta de criação da Fiari consta no “Manifesto por uma Arte revolucionária e independente”, escrito em 1938, no México, a partir de discussões de Breton com Trótski, por ocasião de uma visita do líder surrealista ao dirigente bolchevique. Elaborado por Breton, o texto foi posteriormente editado por Trótski e, ao contrário da maioria dos tantos manifestos literários e artísticos publicados no século 20 que desencadearam grandes movimentos de agitação cultural, colocou o problema da arte sob um ponto de vista histórico. Ou seja, não se discutiu como deveria ser o fazer artístico, mas a independência e a liberdade dos artistas para seu exercício, questionando as relações historicamente postas entre cultura e capitalismo. 

Nesse contexto, é central reconhecer que a cultura estabelecida (artística, filosófica e científica) era, em grande medida, criação do capitalismo. Em tal perspectiva, admitia-se que, embora tenha havido civilizações antes do sistema econômico vigente, foi nele que a cultura começou a ter desenvolvimento amplo devido a um progresso mais expressivo na economia — essencialmente dominada pela burguesia, o que fez da arte realizada até então um produto dessa classe. Por exemplo, as manifestações surgidas na Itália durante a Idade Média, a partir do século 14, daquilo que se convencionaria chamar cultura ocidental já são entendidas como aceno do desenvolvimento da burguesia, tendo sua expansão voltada especificamente às principais atividades financeiras da época. 

O poeta Roberto Piva, do grupo surrealista paulistano: 'Olha lá, a alma de André Breton'

Apesar de já haver diversas contradições entre arte e capitalismo, esses elementos apenas começaram a se opor totalmente a partir do fim do século 19, com a primeira crise do sistema e a ascensão e posterior consolidação dos monopólios. Assim, o regime de livre concorrência foi substituído pelo totalitarismo, tendo como consequências a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa, ambas no início do século 20. As vanguardas artísticas em todo o mundo começaram então a expressar cada vez mais a decadência da cultura capitalista e de seus padrões, especialmente depois da quebra da bolsa de valores em 1929, quando a aliança entre o setor artístico e a burguesia se desfez definitivamente e os artistas passaram a ser tratados como inimigos do sistema. Tem-se, portanto, a tese central do manifesto: depois de um processo histórico, o avanço econômico capitalista se tornou absolutamente antagônico ao avanço artístico. 

Retrato de Breton, pelo pintor romeno Victor Brauner

No Brasil, a tradução desse manifesto foi publicada integralmente por Pagu e Mário Pedrosa no jornal Vanguarda Socialista em 1946. No contexto europeu, a obra foi o estopim para a perseguição política a André Breton, intensificada com o começo da Segunda Guerra Mundial. Por isso, em 1941, asilou-se nos Estados Unidos, retornando à França apenas cinco anos depois para combater o realismo burguês imperante na literatura e continuar promovendo o surrealismo. Em Paris, permaneceu até a data de sua morte em 28 de setembro de 1966. 

Sobre a morte, Breton já havia alegado em seu manifesto surrealista: “Desejo ser conduzido ao cemitério num caminhão de mudanças”. Fazendo referência a essa declaração, o poeta Roberto Piva, do grupo surrealista paulistano, no documentário “Uma Outra Cidade” (Ugo Giorgetti, 2000), comenta um fato curioso passado naquele 28 de setembro de 1966: “Nós [o grupo surrealista] estávamos na avenida Rio Branco, quando passou um caminhão de mudanças com um armário amarrado na carroceria. O armário batia as portas e de dentro saía um lençol branco, esvoaçante. Aí o [Roberto] Bicelli gritou: ‘Olha lá! A alma de André Breton’”. Apenas no dia seguinte, Piva abriria o jornal e leria o anúncio da morte do escritor.