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Focuarte discute políticas de salvaguarda do patrimônio imaterial alagoano

O Fórum Permanente de Cultura Popular e do Artesanato vem promovendo uma série de debates sobre a cultura do estado; evento na segunda-feira (1º.) abordou a resistência dos bobos e das cambindas no litoral Norte

03 de Março de 2021, 10:57

Eduardo Afonso Vasconcelos

Reunindo mais de 40 pessoas na noite de segunda-feira (1º.), o encontro virtual promovido pelo Fórum Permanente de Cultura Popular e do Artesanato Alagoano (o Focuarte) debateu as condições da sobrevivência de duas manifestações artísticas populares desenvolvidas no litoral norte do estado: o desfile de máscaras dos bobos e a dança das cambindas. O Focuarte nasceu há oito meses em função da crise econômica intensificada pela pandemia, como forma de organizar alguns trabalhadores do setor cultural em torno da discussão de políticas que os resgatem minimamente do abismo em que foram lançados pelo poder público. 

O evento, intitulado “Na Folia de Bobos e Cambindas”, a uma série de encontros mensais que agregam os líderes do fórum e demais interessados em participar. As informações de data e horário podem ser acompanhadas pelo portal on-line ou Instagram da organização. Segundo o jornalista João Lemos, que compõe a liderança do grupo, no site da Focuarte ainda é possível encontrar “um material bastante expressivo e com impacto em todos as regiões do estado”. “Esse conteúdo”, explica, “é produzido a partir do jornalismo cultural focado na salvaguarda de nossos saberes populares.” 

À frente, Mestre Nô conduzindo o grupo de cambinda/ Fotos/ Arquivo/ Divulgação

Dedicado à discussão acerca dessa atividade de salvaguarda, o encontro de segunda-feira teve Mestre Nô como convidado. Condutor do grupo de cambinda porto-pedrense, Mestre Nô iniciou na brincadeira com sua avó Dona Quiquina. Ela fundou o grupo de cambinda Berto da Quiquina (Berto, seu filho e pai de Nô).

A cambinda Berto da Quiquina foi liderada por mais de 60 anos por Seu Berto. A brincadeira é uma tradição de origem africana e se assemelha ao maracatu pernambucano. No entanto, diferentemente do que ocorre na prática do estado vizinho, não há a presença de mulheres – as baianas de nossas cambindas são incorporadas apenas por homens vestidos com bata e saia rodada. 

Esq. à dir., Alexandre Marlon, Thiago Souza, Mestre Gilberto e Sebastian Paiva: Bobo Gaiato

Além de Mestre Nô, fez-se presente à brincadeira virtual o produtor Thiago Souza, outro líder do fórum que fundou, há dois anos, o Centro Cultural Bobo Gaiato, retomando os desfiles carnavalescos das máscaras de bobos pelas ruas de Porto de Pedras. 

Thiago Souza contou que sua relação com os bobos vem da infância, quando acompanhava de perto a produção das máscaras antes do Carnaval. “Era uma mobilização social geral, em que centenas de pessoas se reuniam para as produções e depois saíam em andanças pela cidade.” Acontece que a atividade ficou ameaçada a partir dos anos 1990 e apenas um artista deu continuidade ao trabalho de confecção das máscaras: Mestre Gilberto, morto por complicações cardíacas aos 71 anos em julho do ano passado. Ainda assim, os bobos nas ruas quase desapareceram, o que fez Souza tomar iniciativa para a criação do Bobo Gaiato. 

Há três semanas, o Focuarte havia promovido uma grande ação: a 1ª. Conferência para Líderes Regionais, no Pontal da Barra, litoral sul da capital, aglutinando mais de 70 brincantes de diversas regiões de Alagoas. Um relatório foi escrito para o evento, revelando que a atividade foi pautada no debate sobre alguns aspectos conjunturais nocivos ao setor cultural, porém, não apresentou resoluções práticas. Em certa medida, isso acaba por subverter a efetividade da conferência, pois a problemática envolvendo os trabalhadores da cultura não se dissolverá sem que haja apontamentos concretos. De todo modo, o fórum é uma organização popular e segue com chances de assumir potencial para a conquista de direitos.